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O IRLANDÊS | A nova obra-prima de Scorsese! (Crítica)

Baseado no livro homônimo de 2019, “O Irlandês: Os Crimes de Frank Sheeran a Serviço da Máfia” do escritor americano (e investigador policial) Charles Brandt (que iniciou sua saga em crônicas no livro “I Heart You Paint Houses”, de 2004),está nova produção de Martin Scorsese se torna mais um clássico em sua longa filmografia.

A película é cinema em sua essência mais primitiva, aqui o diretor se preocupa no apuro técnico do posicionamento da câmera (cada ângulo simboliza um direcionamento narrativo) e vemos isso na abordagem em que o premiado cineasta faz deste mundo da máfia, que está menos enérgica e mais pesada. O foco aqui fica no lado sombrio que nos revela como certas escolhas podem trazer a brutalidade de quem vive no meio gângster. Por falar em lado sombrio, foi o gesto que achei para definir. Scorsese já conheceu o topo de seu jogo com Os Bons Companheiros e Casino, mas aos 76 anos e experiente com um universo já bastante familiar em sua filmografia, vemos aqui o cineasta com um novo impulso.

“O Irlandês” Frank Sheeran (Robert de Niro), é quem toma as rédeas onde vemos três linhas temporais (duas delas se encontram posteriormente, formando uma só). Antes um motorista e veterano de guerra que transportava carnes, entrando no contato da máfia após ser acusado por vender parte de sua carga a um gângster e não entregar ninguém no tribunal, “O Irlandês” conhece uma nova realidade quando o chefe da família criminosa da Pensilvânia, Russell Bufalino (Joe Pesci, excelente atuação), o transforma em seu próprio Hitman (tipo assassino… rsrs).

Como protagonista atuando em diferentes missões ao longo das décadas, “O Irlandês” aborda uma narração em primeira pessoa e falada diretamente ao espectador, o humor peculiar dosado com a tensão explícita em diálogos, a direção que faz a câmera ir e vir, percorrendo lentamente cada ambiente para que o espectador participe e veja os detalhes e a vibração que o trio principal (formado por De Niro, Pesci e Al Pacino como Jimmy Hoffa) provam um desenvolvimento minucioso, tudo isso graças ao roteiro de Steven Zaillian.

A entrada na máfia já como adulto, o seguimento de caminhos condenáveis, a ausência como pai e marido (como ele mesmo narra), formam a base de tudo, fazendo com que a inclusão de outras peças essenciais seja natural. Assistir tudo isso num tom que preza a crueldade da profissão de Frank e não o fluxo de quem vive uma vida inconstante de sensações difíceis de definir, pois é na jornada que se encontra o propósito.

Mas até chegar a este fio, todos os lados da mesma história são bem equilibrados por Scorsese. Por mais que Joe Pesci e Al Pacino acabam dividindo a cena com Robert De Niro,  o trio de veteranos captam a essência da história e nos dão a chance de ver o mais alto nível em técnica e obviamente que o diretor aproveita a dose emocional contida no simples e raro fato de os três estarem juntos no mesmo filme (que eu já achei foda de mais!!). Diante deste elenco confortável e fenomenal, seria como que aqueles personagens já se conhecessem de outras realidades e épocas.

Pela primeira vez, Scorsese mostra o outro lado da moeda do que realmente é ser um gângster sem a presença de uma trilha-sonora mais animada ou piadas na maior parte do tempo. Aqui, é a já citada melancolia que se faz sempre presente, inclusive na fotografia dominada por cores frias e nos olhares cansados do trio principal. Apesar das breves, mas ótimas cenas em que são inseridos tiros, explosões e diálogos que antecedem medidas drásticas e violentas, “O Irlandês” alimenta este clima gângster com o silêncio – desde os momentos em que tarefas difíceis terão de ser feitas até retornar à família de Frank.

Quando o personagem pergunta a uma de suas filhas o que ele pode fazer pela família após tantos anos de afastamento, o que ele recebe é o silêncio. Tal quietação é demonstrada pela procura de Frank por uma morte tranquila e segura, além de ser incorporada, também, pela personagem de Anna Paquin, filha e talvez a única mulher da vida de Frank que enxerga desde criança quem o pai e seus companheiros são de verdade. Apesar de ela possuir literalmente uma fala, sua presença diz muito e intimida qualquer um que ali analisa o filme. Este ao meu ver é o maior triunfo que Scorsese projeta diretamente no protagonista.

Sendo assim, percebi que O Irlandês é muitos filmes em um só, e pra quem ama filme de gângster vale muito a pena assistir, pois resulta numa trama dominada por gângsteres egocêntricos e gananciosos que estão desprotegidos de si mesmos e neste momento em que parte do elenco encontra a fragilidade e vem à tona a manifestação da solidão e velhice junto com memórias do passado.

Fica aqui nossa indicação para esse final de ano para assistir com os amigos, uma obra-prima!

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