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WATCHMEN | O túnel do amor - Episódio #08: A God Walks Into Abar (Crítica)

O amor é complicado, é aquilo que te deixa péssimo, aquilo que dói e aquilo que se cura com o tempo e com uma conexão profunda ao ser correspondido. Neste novo e incrível episódio de Watchmen, temos o foco em Jon Osterman, que entrou no corpo de Calvin Jelani e acabou se transformando em Cal Abar, que por dentro dele tinha nada mais, nada menos que o poderoso Doutor Manhattan.

O mais legal disso tudo que ele sabia que amava Angela Abar no momento em que a viu processar as “irritantes” informações de que eles não podiam vencer o futuro conflito que iam enfrentar e mesmo assim ela não se atraiu e enfiou a mão na arma de qualquer maneira para enfrentar a situação com a cara e a coragem. Esse momento ocorre mais de dez anos depois que eles se conheceram em um bar em Saigon, mas ele a amava a cada momento da mesma forma, pois sabia que esse momento estava chegando pela divindade temporariamente deslocada que ele é. Mas mesmo que não gostasse, ele ainda amaria Angela por todo o tempo que compartilharam juntos, e a maior justificada de um amor complicado é justamente o tempo em que você compartilha com sua pessoa amada.

Doutor Manhattan se apresentando a Angela Abar (Regina King) em um bar em Saigon – Watchmen / HBO & DC Entertainment

Em “A God Walks Into Abar” (adorei o trocadilho!) temos uma história de amor. Mas é mais do que isso, e a continuação de uma conversa que o criador Damon Lindelof tem mantido com seu público sobre tempo, amor e a conexão entre eles há mais de uma década. Quase 12 anos atrás, Lost exibiu o que é quase certamente o melhor episódio de sua série. O episódio cinco da quarta temporada mostrou Desmond Hume, um escocês que se perdeu no tempo como Billy Pilgrim. Se Lost era a monografia ou o TCC de graduação de Lindelof sobre o amor, The Leftovers se transformou em sua tese de pós-graduação e agora vem a defesa do doutorado com Watchmen. “A God Walks Into Abar” é escrita por Lindelof em parceria com seu amigo Jeff Jensen, que nos mostram que está história não é sobre o que acontece quando o amor encontra um paradoxo, é sobre como o amor é o paradoxo.

O Doutor Manhattan não desce de seu Éden na Europa porque ele precisa de uma constante. Ele faz porque o destino diz que ele deve e a onisciência do Doutor Manhattan foi superestimada pelos meros mortais aqui na Terra. Sim, ele pode explodir aldeias vietnamitas inteiras com um movimento do pulso, e sim, ele sabe o que você vai dizer antes de dizê-lo. Mas ele ainda é um tolo de sorte, assim como todos nós. Ele é o fantoche que pode ver as cordas, lembra?

Essas cordas levam o bom Deus a Saigon em 2009. Ele se abaixa para pegar uma máscara descartada de Manhattan na rua e ele ‘entra em um bar’ (into Abar, sacaram né?! rsrs). Aqui temos um feito notável ao contar uma história em um nível técnico extremamente alto e embora os episódios anteriores tenham girado em torno da vida de um personagem no presente, ou na vida de um personagem no passado, este gira em torno do passado, presente e futuro de uma só vez. E o sempre presente agora é enquadrado por apenas duas pessoas em um bar, conversando sobre o que está por vir para elas. O milagre da vida de Jon Osterman é que ele experimenta o tempo todo simultaneamente. O milagre deste episódio é que ele é capaz de criar uma sensação semelhante para o espectador.

Estamos lá vendo a conversa dele no bar do Sr. Eddy em Saigon e estamos lá para vendo história da infância do pequeno Jonny Osterman. Sabemos que Jon nasceu em uma família germano-americana, mas o que não sabíamos é que sua mãe deixou seu pai judeu por um oficial alemão, forçando Jon e seu pai a procurarem refúgio em uma mansão no qual Jon irá construir na lua Europa.

Doutor Manhattan construindo seu mundo na lua Europa e dando vida a Philips e Crookshanks  (Tom Mison e Sara Vickers) – Watchmen / HBO & DC Entertainment

Os seres que um dia serão chamados de Philips e Crookshanks foram modelados de acordo com o gentil senhor e senhora daquela mansão. Jon, jovem demais para entender o que está acontecendo, testemunha o senhor e a mulher se despirem e começa a fazer amor antes de ser pego. Isso marca o segundo personagem de Watchmen, cuja história de origem de super-heróis apresenta um elemento sexual. Mas, ao contrário de Wade Tillman, que foi sexualmente traumatizado quando adolescente, Jon é tratado com delicadeza pelo senhor e pela senhora. Eles gentilmente o ensinam sobre sexo e lhe dão uma bíblia para que ele possa entender melhor a vontade de Deus. Quando o Doutor Manhattan se torna um Deus, é sua vontade prestar-lhes homenagem.

Logo em seguida ao lembrar disso, Jon ri porque agora Adrian Veidt está dizendo que ele não tem imaginação. A maior ferramenta e a disposição de Lindelof e Jensen em “A God Walks Into Abar” é a maneira pela qual seu Deus titular experimenta o tempo. Isso lhes permite apresentar uma bela história de amor, em última análise, estripada. Mas também apresenta a oportunidade de acelerar esse enredo para onde ele precisa estar de uma maneira tão lógica e emocionante.

Com Jon lembrando da conversa que teve com Veidt, aqui temos mais um trabalho magistral de Jeremy Irons ao atuar como um Adrian Veidt mais jovem do que estamos vendo agora, nessa época ele estava perdido e sozinho nos salões cavernosos de Karnak, seu covil antártico. O dia entre Jon e Adrian é deslumbrante e aqui temos mais uma ótima ligação sobre como Veidt foi parar no local em que ele está agora. O mais legal de Wacthmen é que precisamos dar um passo atrás e apreciar o puro e exuberante triunfo de como está série é incrível e que alguns detalhes são revelados nas entrelinhas. 

Com o futuro de Adrian definido com pessoas ansiosas para ama-lo, aqui fica tudo mais claro porque aqueles clones amam tanto o personagem. Eles o amam tanto que ele acaba preso pelo crime de tentar deixá-los. Eles o amam tanto que, na primeira cena pós-créditos de Watchmen, um deles realmente deixa Adrian sair. Game Warden entrega a Veidt um bolo feito por um de seus clones que esconderam lá dentro uma ferradura. Veidt começa a trabalhar esculpindo o chão abaixo dele.

Adrian Veidt/Ozymandias (Jeremy Irons) conversando com o Doutor Manhattan que está no corpo de Calvin Jelani/Cal Abar (Yahya Abdul-Mateen II) – Watchmen / HBO & DC Entertainment

Com a simultaneidade focada em Veidt, voltamos para o presente ao sabermos que foi o próprio Ozymandias que deu ao Doutor Manhattan que acabou lhe dando a única coisa que ele queria: o dispositivo de amnésia que finalmente permitiria que ele se tornasse um homem de verdade.  Com tudo agora organizado e sem pontas soltas, sobra tempo ainda em “A God Walks Into Abar” para vermos a introdução de um paradoxo próprio em Watchmen. Jon caminha pela água na piscina da família Abar e logo em seguida teletransporta as crianças Abar para estarem com seu avô em um local seguro em Tulsa. 

Ele está esperando a chegada deles desde que Jon lhe contou sobre isso em 2009. Acólito do eterno agora, Jon ainda está com Will e conversando com ele em 2009, e ele fala com Angela em 2019 também. Angela pede a Jon que faça uma pergunta ao avô: como ele sabia que Judd Crawford fazia parte do Ciclope e tinha uma túnica da Klan no armário. E Will responde falando que não sabe quem é Judd Crawford.

Aqui temos outro paradoxo. O que veio primeiro: a galinha ou o ovo? Quem matou Judd Crawford: Will Reeves ou Angela Abar? A resposta, em última análise, não importa. Paradoxos são importantes apenas porque existem pessoas que são importantes e que se importam com a resposta. O paradoxo de Judd Crawford é a versão graduada da bússola de John Locke porque as pessoas envolvidas sentem suas repercussões. Angela ama Jon e Crawford. Talvez ela ame seu avô. E aqui estão todos envolvidos na tapeçaria absurda que o destino lhes inventou.

Cenas de destaque do episódio 08, ‘A God Walks Into Abar’ – Watchmen / HBO & DC Entertainment

Existe uma relação entre tempo e amor e Lindelof ainda está elaborando os detalhes. Por enquanto, podemos dizer com confiança: a única moeda real que qualquer um de nós precisa gastar é o tempo e com quem passamos esse tempo com assuntos. Angela e Jon passaram 10 anos juntos no túnel do amor e antes da chegada da Sétima Kavalaria, cada dia daquele tempo era ontem, hoje e amanhã, tudo em um. 


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